Acabei o estágio de Medicina na UF1 do Hospital Padre Américo (E.P.E.) em Penafiel, e comecei o estágio de Intervenção Comunitária no Centro de Saúde de Matosinhos... Foi uma mudança tremenda: passa-se de "burro de carga" e "trabalho de cão" com basicamente idosos todos dependentes, para elaboração de projectos sobre Cuidados com o Sol e Calor, com miúdos de 4 e 5 anos...
Querem aprender um pouco sobre miúdos desta idade? ;) LOL Aproveitem então...
"Cada idade da criança não é meramente a soma do que a criança dessa idade é capaz de fazer. Pelo contrário, cada idade tem a sua própria individualidade, a sua própria tarefa de desenvolvimento e a sua própria maneira de ser. Visto que o desenvolvimento não avança numa simples direcção em linha recta, é comum que idades de desequilíbrio alternem com idades de equilíbrio. Contudo, estas alternâncias tendem a ser mais lentas à medida que aumenta a idade da criança.
A CRIANÇA NA SEGUNDA INFÂNCIA – MODIFICAÇÕES
A segunda infância, “uma fase mais saudável e menos ameaçadora”[1] da vida, compreende um período sensivelmente entre os 3 e os 5 anos, idade pré-escolar. Nesta fase, ocorre um desenvolvimento franco das capacidades motoras (grossas e finas), e das capacidades mentais (memória, inteligência, linguagem e aprendizagem). (PAPALIA, 2000, p.184)
Relativamente ao aspecto físico, é menos acelerado do que na primeira infância. Não obstante, o esqueleto da criança torna-se mais robusto, proporcionando-lhe maior resistência ao meio, protegendo os órgãos internos, funcionando ainda como uma forma de desenvolver as capacidades motoras da mesma. Pelo início da segunda infância a primeira dentição deverá estar completa, permitindo à criança mastigar/comer o que quiser; ao longo desta fase, a dentição definitiva também vai-se desenvolvendo.
A evolução das habilidades motoras, quer grossas, quer finas, é notória, onde as crianças passam a correr mais, saltar mais longe, jogar à bola, atar os cordões dos sapatos com laços, desenhar de forma mais elaborada no papel, abotoar uma camisa, comer com os próprios talheres, aprender a usar o sanitário com mais independência, bem como na higiene oral e no banho, entre outras tarefas. Tal facto deve-se ao desenvolvimento acentuado e maturação das áreas sensoriais e motoras do córtex cerebral, o que permite uma maior e melhor coordenação do “que as crianças querem e podem fazer”. (PAPALIA, 2000, p.184-185)
3 Anos
A criança de 3 anos é dotada com um interesse pelas outras pessoas. Observa-lhes as expressões do rosto, a fim de descobrir o que estas significam, e é sensível a elogios apreciando um humorismo simpático. A criança procura agradar e obedecer, ao invés de contrariar. Revela uma propensão positiva para compreender o seu ambiente e para corresponder as exigências da cultura. (GESELL, 1979)
Nesta idade, a criança está ainda a adquirir um considerável domínio inibitório dos esfíncteres, pelo que é normal que este controlo seja ineficaz em algumas alturas, visto que este é um processo que a criança irá aprender gradualmente: a criança inicialmente refere querer ir à casa-de-banho para evacuar e urinar, pelo que progressivamente vai deixando de usar a fralda durante o dia, e posteriormente, durante a noite. Satisfaz assim, as suas exigências, e carece apenas de uma ajuda concreta para lhe lembrar que são horas de ir à casa de banho ou de tomar a sua refeição.
Por outro lado, a enurese, na qual a criança urina repetidamente durante a noite, é comum. As estratégias a adoptar nestas situações, com mais sucesso, incidem sobre os reforços positivos e recompensas pela criança manter-se seca. (PAPALIA, 2000, p.188)
A carne, a fruta e o leite encontram-se agora na lista das preferências, sendo contudo as sobremesas e os doces os mais desejados; as hortaliças vão sendo aceites pouco a pouco. Tendo em conta a tendência que a criança nesta idade tem para se atrasar na refeição, é preferível dar-lha mais cedo, ao invés de insistir com ela, dar-lhe a comida ou mesmo deixá-la ficar sozinha à mesa. Ela é capaz de segurar uma colher entre o polegar e o indicador e a chávena pela asa. A criança insiste agora mais em ajudar a lavar-se, pelo menos parcialmente e resistem a sair do banho; despem-se com maior interesse e habilidade do que se vestem; calçam as meias e os sapatos e vestem as cuecas, camisolas ou os vestidos. Contudo, nem sempre conseguem distinguir a parte de trás e a parte da frente nem abotoar os botões, e embora tentem atacar os sapatos geralmente fazem-no mal.
Relativamente à linguagem, a criança exprime-se por frases completas constituídas normalmente por 3 palavras, utilizando-as como instrumentos do pensamento. Emprega as palavras com maior confiança e com uma inflexão inteligente, embora não consiga abandonar a pronúncia infantil antes dos 4 ou 5 anos. De modo a praticar as palavras, monologa e representa, combinando a acção com as palavras, criando situações teatrais para experimentar e aplicar as palavras no seu vocabulário. Escuta as palavras com uma segurança e uma compreensão cada vez maior. (GESELL, 1979)
É capaz de contar ate três; de comparar dois objectos (o que implica um processo lógico de três fases); é capaz de combinar três cubos para construir uma ponte; combina um traço vertical e um traço horizontal para desenhar uma cruz; é capaz de trocar com a outra pessoa o objecto A pelo objecto B, e nos jogos é capaz de esperar pela sua vez.
Nesta idade, começam a acentuar-se mais do que antes as diferenças de sexo, no que toca à escolha dos brinquedos. O espírito de cooperação de uma criança de 3 anos encontra-se ainda numa fase crescente, pelo que se poderá encontrá-la muito frequentemente a brincar sozinha. Carece, deste modo, de desenvolver a sua independência. Toda a sua organização motora está mais equilibrada e mais fluida, já não anda com os braços esticados mas baloiça-os à maneira do adulto. Grande parte dessa docilidade social assenta em pura maturidade psicomotora; tem mais segurança e agilidade nos pés, sabe esquivar-se, atirar, parar de repente e dar voltas apertadas. (DIRECÇÃO GERAL DA FAMÍLIA, p.7)
Os passatempos sedentários também lhe agradam, exigindo uma delicada coordenação motora.
A criança de 3 anos encontra-se já senhora de si, conquistou o poder de apreciar e de escolher entre 2 alternativas contrárias. Emocionalmente está menos virada para si própria. As suas relações pessoais são mais flexíveis. A dependência de si mesmo e a sua sociabilidade equilibram-se uma à outra. Todo o seu sistema de acção está a trabalhar de uma forma bem equilibrada.
O negativismo, obstinação e contradição dos 6 meses anteriores, dão lugar a uma compreensão nova das exigências sociais. Longe de se lhes mostrar contrária a criança procura compreender essas exigências e ir ao encontro delas. (DIRECÇÃO GERAL DA FAMÍLIA, p.7)
A criança gosta:
De flores e frutos;
De regar as plantas;
De brincar com água e dar banho aos bonecos;
De música, canto e ritmo;
De histórias;
Que conversem com ela;
De brincadeiras ao ar livre;
De fazer construções;
De correr e saltar;
De andar de bicicleta.
Finalmente, a sua noção do tempo é fraca, mas bem definida dentro das suas limitações, sendo capaz de distinguir entre o dia e a noite.
3 Anos e meio
Os 3 anos são uma idade submissa; já os 3 anos e meio são precisamente o contrário. A criança nesta idade parece encontrar o seu maior prazer em recusar e a insistir em que as coisas se façam de uma maneira diferente: à sua maneira. A sua própria vontade sobrepõe-se a qualquer agrado ou desagrado que os outros sintam, pois ela apresenta ideias muito assentes e revela fraca capacidade para se adaptar aos desejos ou às maneiras das outras pessoas. Recusar-se a obedecer é, talvez, o aspecto básico deste período agitado e perturbado da vida da criança. Agora é comum a criança parar a meio do caminho e teimar em não dar nem mais um passo, rejeitar qualquer alimento que lhe ofereçam e a preferir todos aqueles que não haja nessa altura e a opor-se de tal maneira a vestir e a despir qualquer peça de vestuário (GESELL, 1979).
A criança sente-se à vontade para dar opiniões e fazer advertências, pois é ela quem dita todas as leis, e parece que só se sente segura quando está a comandar. Por outro lado, sente-se posta à margem quando não consegue captar toda a sua atenção e tem consciência dos sentimentos alheios, podendo mostrar-se muito terna nas expressões do seu afecto. É provável que a criança tenha essas fortes exigências para com os outros, porque realmente se sente insegura e não esta convencida da sua capacidade de liderar. Quando ela estiver mais segura de si, será capaz de ceder e de se adaptar mais facilmente aos outros.
Esta é uma idade na qual, mais que em todas as outras, a criança experiencia uma grande tensão, que se exprime através do gaguejar, piscar os olhos, roer as unhas, chuchar no dedo, puxar pelo nariz, esfregar os genitais, mastigar um lençol ou uma peça de roupa, salivar em excesso, cuspir e ter tiques. (GESELL, 1979)
As brincadeiras de uma criança de 3 anos e meio com companheiros imaginários constituem um dos aspectos mais encantadores no seu jeito de brincar, e é nesta altura que se começam a revelar as amizades em relação a certas pessoas em especial, e o desagrado, ou mesmo a repulsa, de outras pessoas.
4 Anos
A criança de 4 anos domina melhor todo o seu equipamento motor, incluindo a voz. É capaz de atirar um objecto com a mão levantada acima do ombro, de cortar a direito com uma tesoura, atar os sapatos e aguentar-se de pé numa só perna. Possui elevada energia motora.
Gosta de utilizar palavras novas e diferentes, experimentá-las e de brincar com elas, é uma criança muito faladora, sendo nesta idade que o fluxo das suas perguntas atinge o máximo. Tem tendência a repetir frases feitas da cultura linguística em que vive, e não abandona um tema antes de o esgotar e a exaurir todas as possibilidades verbais. A criança faz inúmeras perguntas, apreende analogias e manifesta uma tendência activa para conceptualizar e generalizar. (GESELL, 1979)
Há uma exuberância linguística e uma certa ordem; conta histórias incríveis; é gabarola; é linguareira, ameaça; inventa justificações e chama nomes. Contudo, os seus aspectos simpáticos compensam-na largamente. É uma fase plena de crescimento.
Também a sua actividade mental é mais activa, traduzida num descuidado emprego de palavras e em rasgos de imaginação e fantasia. É alegre, estonteada mas é mais assente do que superficialmente nos pode parecer.
“A criança no fundo está a lutar, para se identificar a si mesma.” (DIRECÇÃO GERAL DA FAMÍLIA, p.9)
A explicação da psicologia da criança de 4 anos reside na sua intensa energia conjugada com uma organização mental de grande fluidez; a sua imaginação está em quase perpétuo movimento.
A criança de 4 anos tem inúmeros talentos. Pode ser sossegada, barulhenta, calma, arrogante, meiga, insinuante, independente, social, artística, cooperante, indiferente, curiosa, franca e competitiva. Está numa fase de desenvolvimento, no que respeita às relações interpessoais e à comunicação social, e de rápida aculturação.
Na vida de grupo, estas crianças organizam-se em grupos de 3 ou 4, muitas vezes com separação entre rapazes e raparigas. Erguem-se barreiras sólidas e excluem-se os intrusos. O sentimento de pertencer ao grupo é um passo para a compreensão da natureza de um grupo social. A criança está mais interessada numa socialização do que na oposição que a dominava aos 3 anos e meio, revelando isso no grande prazer que sente em se vestir como um adulto e em imitar-lhe as acções. (GESELL, 1979)
Nas brincadeiras teatrais mete-se nos papéis e sai deles com a maior facilidade. No desenho é muitas vezes um autêntico improvisador. Põe nomes nos desenhos durante a sua execução ou depois dela e não antes, o que prova a sua imaginação. (DIRECÇÃO GERAL DA FAMÍLIA, p.8)
A criança é capaz de se lavar e de se enxugar depois do banho, lavar os dentes, vestir-se sozinha e de distinguir a frente das costas, apresentando mais dificuldade em dar laçadas e abotoar os botões das costas. Ajudam a por a mesa mas não se mantêm bem sentadas durante toda a refeição, e podem ter necessidade de interrompê-la para irem à casa de banho. Há uma certa tendência para exigir repetições de um mesmo alimento. As crianças desta idade são capazes de ir à casa de banho sozinhas, e mostram-se muito interessadas em observar as outras pessoas na casa de banho, e revelam ainda pronunciada curiosidade pelas casas de banho alheias.
Embora já seja bastante auto–suficiente, pode gostar de levar consigo para a cama o ursinho de peluche, para as suas conversas teatralizadas, e gosta de ficar com a luz acesa durante um breve período de tempo. A criança de 4 anos é um ser verdadeiramente social e está presentemente a adquirir um forte sentimento de família e do lar, comparando as coisas que vê fora do lar com as que tem em casa.
A criança gosta de:
Desenhar objectos com pouco pormenor, faz bonecos toscos e letras;
Pintar com precisão durante algum tempo;
Identificar as letras;
Vestir-se sem grande ajuda;
Actividades que exigem equilíbrio;
Entreter-se sozinha, mas também de brincar com outras crianças;
Música e bicicletas.
5 Anos
Os cinco anos são uma idade nodal, que assinala simultaneamente o termo e o início de uma época de desenvolvimento.
A criança já percorreu uma longa distância na espiral ascendente do desenvolvimento; já subiu a parte mais íngreme do caminho, que terá de percorrer ate se tornar adulto. Não é um produto acabado mas já nos dá sinais do homem ou da mulher que virá a ser. Já tem marcada a sua individualidade.
Em oposição dos 4 anos de idade, aos 5, a criança gosta de estar junto do lar, ao pé daquilo que sabe que é seguro e acima de tudo ao pé da mãe. A criança de 5 anos é calma, confiante, segura, precisa, sincera, risonha e responsável.
Sente-se feliz a brincar horas a fio às cenas da vida doméstica. Isso porque precisa de tornar mais familiar o que já lhe é familiar. Tem um sentido muito forte de posse. As coisas de que gosta, sente orgulho em possui-las. Tende a ser realista, concreta e a referir tudo à sua pessoa. Não é agressiva nem conflituosa. É mais ponderada do que uma criança de quatro anos. Pensa antes de falar. Busca o apoio e orientação dos adultos e gosta de ser ensinada. (DIRECÇÃO GERAL DA FAMILIA, p.11)
O seu domínio motor delicado, expresso através do desenho, melhora consideravelmente, passando imenso tempo a desenhar. Começam a manifestar interesse pelas letras e números. A criança fala sem articulação infantil e é capaz de contar uma longa historia. Prefere as brincadeiras colectivas e sente-se socialmente orgulhosa das suas roupas e das suas proezas. Muitas crianças dessa idade têm crises de medo de que a mãe as abandone, podendo o seu sono ser perturbado por pesadelos.
A docilidade da criança de cinco anos não significa que seja altamente sociabilizada. Os jogos de grupo limitam-se, em geral, a um grupo de três pessoas, e a criança orienta-os com a preocupação fundamental de atingir os seus objectivos pessoais de preferência aos objectivos do grupo. A criança dessa idade tem uma noção pratica do ontem e do amanha, mas compreende melhor o «eu». Busca simpatia e aplauso. (DIRECÇÃO GERAL DA FAMILIA, p.12)
A criança de cinco anos é muitas vezes um êxito. É graciosa e sabe disso. O corpo não incomoda, esta segura de si própria, sabe onde há-de por as mãos, não choca com os móveis. Há pois uma harmonia e um controle da psico-motricidade.
A criança gosta de:
Brincar no mesmo sítio durante longos períodos;
Mudar de actividade;
Andar de patins, saltar à corda;
Música e dançar;
Ajudar nas tarefas da casa;
Contar histórias e também que lhas contem;
Folhear livros e revistas;
Pintar e desenhar;
Trazer para casa coisas feitas por ela;
Observar o ambiente que a rodeia.
A CRIANÇA PRÉ-OPERATÓRIA – PERSPECTIVA CONSTRUTIVISTA
De acordo com Piaget, a segunda infância caracteriza-se por um período crucial do estádio pré-operatório, onde as crianças, tal como já foi referido anteriormente, apresentam um progresso franco relativamente ao pensamento, que é de origem simbólica, evoluindo para pensamento lógico no estádio de operações concretas.
O fenómeno central de desenvolvimento deste período reside na cognição, que é feita de forma dinâmica, com um papel activo por parte da criança. Esta construção de conhecimento, fundamental ao desenvolvimento ontológico, apresenta-se sob várias formas, permitindo alguns avanços cognitivos, mas por outro lado, limitações ao nível do pensamento pré-operacional.
Egocentrismo: As crianças pré – operacionais consideram o mundo somente através dos seus olhos. O seu modo de pensar reflecte uma posição autocentrada; além disso, elas não conseguem ver uma situação do ponto de vista de outra pessoa.
Em consequência do egocentrismo do pensar das crianças, elas não conseguem entender as consequências das suas acções nas outras pessoas, em termos de sentimentos. Por isso, tentar controlar o comportamento das crianças pequenas pela explicação do efeito de seu comportamento sobre os outros, talvez seja inútil. (FAW, 1981)
Animismo: Associada à característica egocêntrica do pensar pré–operacional, está a tendência de dotar todos os objectos com as mesmas qualidades animadas possuídas pela criança. Assim, uma árvore, uma rocha e a boneca da criança todos podem ver, ter sentimentos e pensar do mesmo modo que ela. (FAW, 1981)
Realismo: Para a criança de 2 a 6 anos, tudo é real. Esta característica apresenta-se intimamente associada ao pensar concreto que esta tem. Para ela é difícil, neste estádio, distinguir entre um sonho ou fantasia, e a realidade.
Centralização: Tipicamente a criança pré–operacional concentra–se ou responde unicamente a um só aspecto de uma situação. Esta centralização pode ser física, como dar atenção a um aspecto físico de um objecto ou evento, ou pode ser temporal, tal como prestar atenção somente a um momento do tempo. Esta tendência simplifica o mundo com o qual a criança tem de interagir, mas também elimina a capacidade para resolver problemas que solicitam a consideração simultânea de mais de um aspecto da situação. (PAPALIA, 1981, p.226)
Exemplo: quando uma mãe é observada a chorar em um casamento, a criança pode centrar-se em um aspecto do evento e supor incorrectamente que as lágrimas indicam tristeza, e desenvolver uma percepção totalmente distorcida da cerimónia do casamento.
(FAW, 1981)
Irreversibilidade: As crianças pré–operacionais podem pensar no que está a acontecer no momento presente, e também no como poderão chegar à próxima meta; porém, têm falta da capacidade de pensar como chegaram ao estado presente. Isto é, não podem retroceder os próprios passos ao nível do pensamento. Esta deficiência é chamada de irreversibilidade. O pensar reversível começa a surgir no quinto ou no sexto ano e significa a transição para níveis superiores de funcionamento cognitivo (PIAGET, 1928).
Raciocínio transdutivo: O adulto aplica-se numa de duas formas de raciocínio:
· Raciocínio dedutivo: Refere-se aos movimentos do geral para o específico (ex: Se eu sei que todos os cães de raça labrador são pretos, e alguém diz que tem um desses animais, eu raciocino que ele é preto.)
· Raciocínio indutivo: Refere-se ao movimento do específico para o geral (ex: Porque vi 50 cães de caça labrador e todos eram pretos, eu raciocino que todos esses cães são pretos)
As crianças pré–operacionais aplicam-se no que Piaget chama de raciocínio transdutivo, que se movimenta do particular para outro igual, sem ter em consideração o geral. A criança pré–operacional raciocina que, se dois eventos concretos ocorrem no passado, eles devem sempre ocorrer no futuro. (FAW, 1981)
O raciocínio transdutivo pode ocasionar conclusões apropriadas. Mas, porque é ignorada a direcção das relações de causa e efeito, também podem ocorrer conclusões incorrectas. (PAPALIA, 1981)
Sendo a segunda infância uma fase muito característica do desenvolvimento humano, e sendo este um ser biopsicossociocultural, o que acontece é que todas estas variantes condicionam a linguagem, vocabulário e dicção, gramática, a fala, e o comportamento, quer em meios sociais, quer em meio familiar.
Por se tratar duma idade de descobertas, a criança apresenta interesse por todo o contexto ambiental envolvente, sofre uma grande e rápida transformação na linguagem, e no léxico gramatical e sintático.
Ao longo da segunda infância, a criança aprende cerca de nove palavras por dia, desde cerca dos dois anos de idade. (RICE, 1982) Pelos seis anos, a criança, em média, tem domínio em cerca de 14 mil palavras, pela capacidade de rápido mapeamento de palavras, que lhes permite absorver o significado de uma nova palavra depois de ouvi-la uma ou duas vezes numa conversa. (PAPALIA, 2000, p.201)
Com base no contexto de uma conversa, a criança em idade pré-escolar forma uma compreensão parcial da palavra e armazena-a na memória; por vezes, isso não significa que utilize estas palavras como um adulto, podendo-se referir ao futuro com a palavra “amanhã”, ou confundir múltiplos significados de palavras: A Sofia de cinco anos disse: “As minhas botas são muito «finas»:”, ao que a Paula retorquiu “Não, não! São bem «grossas»!”. (PEASE; GLEASON, 1985)
Numa fase final da segunda infância, a criança inicia ainda o uso da metáfora, “figura de estilo na qual uma palavra ou frase que geralmente designa uma coisa, é aplicada noutra (VOSNIADOU, 1987): “Porque é que vocês estão-se a portar como dois ursos?! – exclamou a Ana”. Tal facto demonstra “a capacidade de usar o conhecimento sobre um tipo de coisa para compreender melhor outra, capacidade necessária para adquirir muitos tipos de conhecimento.” (PAPALIA, 2000, p.201)
Ao nível gramatical e sintático, as crianças de pelo menos três anos “usam plurais e o tempo passado, e sabem a diferença entre «eu», «tu» e «nós»”. (PAPALIA, 2000, p.201) Dos quatro aos cinco anos, começam a usar preposições como «sob», «sobre», «em» e «atrás».
Em oposição, as tarefas que por vezes lhes são propostas podem ser compreendidas de forma imatura. Vejamos: “João, podes ir ver televisão, depois de guardar os brinquedos” – ele pode interpretar as palavras na sua sequência e pensar que primeiramente, pode assistir à televisão e depois guardar os brinquedos. No final da segunda infância, porém, as crianças usam frases mais longas e mais complexas. Passam a usar mais conjunções, preposições e artigos, em quaisquer partes do discurso, embora desconheçam ainda as excepções à regra; podem dizer “cabeu” ao invés de “coube”, sinal normal de evolução linguística.
Todo o léxico gramatical, vocabulário, e sintaxe traduzem-se na linguagem. Portanto, a forma e a função da fala têm uma ligação. À medida que vão integrando novas palavras, vão-se tornando mais competentes na comunicação. Através da pragmática, “conhecimento prático necessário para propósitos comunicativos, inclui a aprender a pedir coisas, a contar uma história ou piada, a começar a dar continuidade a uma conversa, e a ajustar os comentários à perspectiva do ouvinte” (RICE, 1982), a fala socializada torna-se facilitada. Esta é a fala que pretende ser compreendida pelo ouvinte. Embora Piaget afirme que a fala das crianças é egocêntrica, Shatz e Gelman, através da sua pesquisa, mostram que crianças de 4 anos comunicam com crianças de 2 com uma linguagem mais primitiva, ao passo que Maratsos afirma que crianças de três a cinco anos comunicam entre si de maneira muito diferente com uma pessoa que pode ver e com outra que seja invisual; elas apontam para um brinquedo ao falar com um ouvinte com visão normal, mas descrevem o mesmo para alguém que não pode ver. (PAPALIA, 2000, p.201)
Por outro lado, as crianças neste estádio de desenvolvimento, habitualmente falam de forma audível para si mesmo – fala privada. Piaget descreve este comportamento como parte do egocentrismo inerente ao estádio, sustentando a função simbólica, que não se encontra ainda totalmente desenvolvida, bem como de não distinguirem ainda as palavras das acções representadas pelas mesmas. Vygotsky, em oposição, afirma que a fala privada ajuda as crianças a integrarem a linguagem com o pensamento; vai ainda mais longe: afirma que a fala privada é própria do estádio pré-operatório. Quando estas, já mais velhas, dominam as suas acções, a fala privada vai desaparecendo. (PAPALIA, 2000, p.202)
Inerentes ao processo dinâmico da aprendizagem e linguagem no ser humano, encontram-se a memória e a inteligência.
Uma das premissas, muitas vezes citada, é que as capacidades neurológicas para o armazenamento da memória funcionam plenamente aos 2 anos de idade; e as mudanças que observamos na memória da criança, à medida que elas crescem, resultam do uso dessas capacidades básicas de maneiras eficientes. Não obstante, alguns psicólogos sustentam que a memória melhorada manifestada pelas crianças à medida que vão crescendo é um resultado do aumento na capacidade real de armazenamento da memória.
Memoria de recordação VS memória de reconhecimento
Quando se estuda a memória, o desempenho das crianças numa tarefa será diferente, dependendo de serem ou não solicitadas a recordarem a informação com que anteriormente se defrontaram; ou se são solicitadas a reconhecer se alguma coisa que actualmente lhes é representada é a mesma que aquela à qual foram expostas no passado. A memória de reconhecimento é sempre melhor do que as recordações; a diferença entre o desempenho nos dois tipos de tarefas é mais pronunciada com as crianças mais novas do que com as mais velhas.
Memória sensorial
Quando olhamos para um objecto ou ouvimos 1 som, um traço da estimulação permanece, ainda depois que o estímulo tenha terminado. Esse traço é a memória sensorial. Embora não exista evidencia de que com o aumento da idade haja um aumento na extensão de tempo que o traço sensorial permanece em disponibilidade, há evidência de que as crianças com 5 anos não podem responder de forma tão eficaz na memória sensorial quanto as crianças de mais idade.
Memória a curto prazo
A memória sensorial é transferida para a memória a curto prazo, onde pode ser mantida em armazenamento durante aproximadamente 30 segundos. Depois, é perdida ou transferida para memória a longo prazo.
Exercitar a informação é uma estratégia efectiva para melhorar a memória a curto prazo. Para isso, há necessidade da linguagem. O desenvolvimento da linguagem da criança de 2 a 4 anos impede o uso efectivo de uma estratégia de exercício, reduzindo portanto, a sua memória a curto prazo.
Memória a longo prazo
A informação armazenada na memória a curto prazo pode ser transferida para a de longo prazo, para uso à posteriori. Ao contrário da memória a curto prazo, o exercício contínuo não é importante para manter a informação na memória a longo prazo. No entanto, a sua efectividade é determinada pela maneira como o indivíduo organiza a informação que teve no sistema de armazenamento da memória a longo prazo.
Tal como anteriormente referido, um dos factores que influencia o desenvolvimento da linguagem e memória é a inteligência. Trata-se do potencial cognitivo do ser humano, “de um atributo que as pessoas possuem em vários graus”. (FAW, 1980, p.182) Através da inteligência, que tal como a personalidade, é individual, desenvolvemos a capacidade de raciocinar, resolver problemas, pensar de forma concreta, mas também abstracta, adaptarmo-nos constantemente a novas situações, e a generalizar a solução de um problema para outros do mesmo tipo. Denota-se portanto, uma extrema interdependência com a aprendizagem, factor de dinamismo na produção de conhecimento. (FAW, 1980, p.182). A extensão da inteligência de uma pessoa, varia consoante a forma em como a mesma expressa essas capacidades, atrás referenciadas.
Tratando-se de um factor de desenvolvimento individual, a inteligência, deve então ser medida, para distinguir pessoas mais de menos inteligentes. As medições de inteligência são feitas através de testes de inteligência calculados segundo diferentes tipos de escala: Escala de Stanford-Binet, Escala de Wechsler. O resultado destes testes revela então o quociente de inteligência (QI) do indivíduo.
Em suma: para produzir conhecimento é necessária uma inteligência, que associada a uma memória, e à prática dos mais variadíssimos actos, constituirá uma série de diferentes aprendizagens, logo, cria desenvolvimento ao próprio ser que experiencia.
[1] Desenvolvimento Humano – PAPALIA, Diane E.; OLDS, Sally W. – Artmed Editora ISBN 85-7307-646-1 – 7ª Ed. p.184
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