12 de Agosto
“ (…) A desgraça que nos fere não é nunca aquela que previmos, visto que o perigo não se dá a conhecer. (…)
Toda a gente sabe que não há regra sem excepção, mas este homem possui um tal espírito de justiça e de boa fé que, quando receia ter visto qualquer coisa mais inconsiderada, duvidosa ou exagerada, não se cansa de limitar, de modificar, acrescentar e de diminuir, de forma que da primeira asserção já não resta coisa alguma. (…)
O roubo, incontestavelmente, é um crime. Mas o desgraçado que, para não morrer de fome, ele e os seus, se decide a roubar, é digno de piedade ou de castigo? Quem ousará atirar a primeira pedra ao marido ultrajado que, no arrebatamento da sua justa cólera, matar a mulher infiel e o seu infame sedutor? Quem se atreverá a apedrejar a donzela que, num momento de delírio voluptuoso se perdeu em ardentes transportes de amor? (…)
- A natureza humana (…) tem os seus limites, pode suportar, até um certo grau, a alegria, a dor e a tristeza; quando, porém, se ultrapassa esse grau, a natureza sucumbe. Pouco importa saber se um homem é fraco ou forte, mas apenas se é capaz de suportar os seus sofrimentos, quer físicos quer morais; e, na minha opinião, é tão desassisado qualificar de covarde o homem que se suicida como chamá-lo ao que morre de uma febre maligna. (…)”
“ (…) Era uma criança simples e bondosa, vivendo no estreito círculo das suas ocupações domésticas, trabalhando durante toda a semana e sem conhecer outros prazeres além do de sair ao domingo a passear pela cidade com as companheiras, com o modesto vestido que tanto lhe custara a ganhar; e uma ou outra vez, em dia de festa, dançar com algum rapaz conhecido e, quando muito, tagarelar com alguma vizinha sobre qualquer rixa ou maledicência. Pouco a pouco esses primeiros prazeres tornaram-se-lhe insípidos, até que, um dia, encontra um homem para quem um sentimento desconhecido a atrai com força irresistível. Nele depões todas as esperanças, esquece tudo o que a rodeia, já não vê, já não ouve, não busca senão esse homem, só para ele vive e respira. Como não está corrompida pela vã satisfação de uma vaidade inconstante, todos os seus desejos visam um fim: ser dele, achar nessa união toda a felicidade que lhe falta, realizando desse modo o constante sonho da sua vida. Mais promessas, constantemente renovadas, transformaram-lhe a esperança em certeza; ternas carícias avivam-lhe o fogo do coração e apoderam-se-lhe da alma inteira; mergulha, por assim dizer, na prelibação de todos os prazeres, perde a cabeça, afunda-se no oceano de felicidades cuja miragem a atrai, estende os braços para neles receber o objecto dos seus desejos… e é nesse momento que o seu amado a abandona!... Aterrada, gelada de espano, inconsciente, encontra-se à beira de um abismo… Rodeiam-na trevas profundas, nenhuma esperança, nem um conforto, o futuro negro… Tudo lhe fez perder aquele que era a sua vida inteira, completa. Não vê o vasto universo que tem ante os seus olhos, nem os homens que poderiam reparar-lhe a perda; sente-se isolada… e cega, só, desprezada por todos, martirizada pela dor intensa que lhe dilacera o coração, atira-se ao precipício, refúgio supremo de todos os sofrimentos e agonias. (…)”
“ (…) – Amigo! (…) O homem é sempre homem! E o pouco juízo que um possa ter a mais do que outro nada pesa na balança quando as paixões se desencadeiam, ou quando são ultrapassados os limites prescritos à condição humana. Mais ainda: é que… Mas falaremos disso noutro dia… (…)”
15 de Agosto
“ É uma verdade incontestável: não há no mundo nada mais necessário ao homem do que a afeição. (…)
A primeira impressão encontra-nos sempre em disposição favorável: o homem é de tal modo feito que se lhe pode fazer aceitar as coisas mais fantásticas e inverosímeis; e, uma vez aceites, ai de quem lhas alterar ou pretender apagar-lhas o espírito!”
18 de Agosto
“ (…) O que me comove e corrói a alma não são esses raros tremores de terra que tragam as nossas cidades. Não. O que me mina o coração é essa força imensa de destruição que a natureza contém em si própria, que nada edifica sem que destrua o que lhe está próximo, ou a si não se destrua. E aqui tens o que me condena a mil tormentos. Céu, terra, potências que me rodeais: em vós apenas vejo um monstro, sempre devorador e sempre esfaimado!”
22 de Agosto
“ (…) Perdi toda a energia, vejo-me caído numa inquieta indolência; não posso estar inactivo, e, apesar disso, já não posso fazer coisa alguma.
Já não tenho imaginação nem sensibilidade; a natureza já não me impressiona e os livros causam-me tédio. (…)”
27 de Outubro
“Apetece-me às vezes rasgar o peito e fazer os miolos quando vejo quão pouco nos podemos valer mutuamente. Ah! O amor, a alegria, o fervor e as delícias que não sinto, não mas pode ninguém dar; e, com o coração inundado de ventura, não me é possível tornar feliz esse outro que ante mim se conserva frio e inerte! (…)”
3 de Novembro
“Sabe Deus quantas vezes tenho adormecido com o desejo, até mesmo com a esperança, de não mais acordar! Mas, no seguinte, abro os olhos, torno a ver o sol e sinto-me miserável!
Oh! Porque não sou eu hipocondríaco, para poder culpar o tempo, qualquer pessoa, um plano frustrado? Então, o fardo insuportável da minha desolação não me oprimia senão por metade. Ai de mim, sei bem que a culpa é toda minha… (…)
Sofro muito! O que constituía a alegria e a ventura da minha existência, essa força divina e vivificante que criava mundos em roda de mim, desapareceu! (…)”
6 de Dezembro
“ (…) Basta que feche os olhos para logo ver os dela, sempre como um oceano, como um abismo; estão à minha frente, estão dentro de mim, enchem todo o meu cérebro, todos os meus sentidos. (…)”
Sem entrar em detalhes, tal como sabido, este romance não acaba bem para a nossa personagem principal...
A pouca sorte que alguns de nós, seres humanos, é que não lhes é permitido viverem o amor que lhes supostamente era destinado...
E nesta história real, foi isso que aconteceu...
Numa verdadeira utopia, isto não seria possível. Porém, a utopia simplesmente não existe... E daí que eu, que vivo uma situação semelhante a esta história, me consciencialize de que não havendo utopias, tenho de me agarrar às pequenas alegrias que o meu dia-a-dia me proporciona...
É uma questão de adaptação... porque "o hábito faz o monge"...
Penso que por hoje chega de sentimentos e futilidades afins... pessoas a morrerem à fome e milhões de pessoas como eu a expressarem aqui e ali, expressões de auto-comiseração... Não vivo feliz! Mas sobrevivo... e muitos infelizmente não têm essa sorte... Talvez pensar assim não seja má ideia...
Fiquem bem... Fiquem em paz. [[[]]]
sábado, outubro 13, 2007
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